Experiências – Liliana Gaspar

Experiências

Liliana Gaspar
Dublin, Irlanda

1. Fala-nos um pouco da tua carreira e desde quando estás emigrada.

De uma formal geral, considero que a minha vinda para a Irlanda permitiu melhorar a minha qualidade de vida nalguns aspetos fundamentais, sobretudo na área profissional. Apesar da crise, que faz com que já não seja possível encontrar emprego tão facilmente, uma vez estando empregado o poder de compra é superior ao poder de compra em Portugal.

Um outro aspeto que considero bastante diferente é a cultura de trabalho. Sinto que há menos diferencas entre “classes” do que há em Portugal. Os chefes e os patrões arregacam as mangas e fazem o que é preciso fazer, e os empregados tem valor, não sao tratados como inferiores ou dispensáveis. Quando vivemos em Portugal, crescemos habituados a ideia de que é relativamente “normal” que os patrões nos humilhem, ameacem, etc. É preciso sair do país para compreender que existem outras realidades. Adicionalmente, a idade tem pouca importancia quando se procura emprego, e aliás, a data de nascimento nem sequer é mencionada no CV, nem ninguém tem o direito de a pedir.

2. Quais os aspectos positivos e os maiores desafios encontrados?

Apesar dos beneficios, viver na Irlanda constituiu e constitui ainda um sacrifício para mim, na medida em que o clima, a comida e certos aspetos da cultura deixam muito a desejar. O clima, como se sabe, é cinzento a maior parte do ano. Ao início, enquanto estamos excitados com a mudanca, não se sente, mas ao fim de muito tempo sempre na mesma, provoca uma sensação de se estar preso num sitio fechado… permanentemente. Lembro-me de literalmente chorar no primeiro Verão, por não ver o Sol há tanto tempo.
A comida (os alimentos que se compram no supermercado) não tem em geral a mesma qualidade, porque os irlandeses são viciados em fast-food, doces, etc, portanto não ha procura suficiente de outros tipos de alimentos que faca com que a oferta seja mais rica e variada.

O facto é que os irlandeses são um povo pouco sofisticado, o que é bom e mau. É bom porque são tolerantes e pouco exigentes; aceitam bem os estrangeiros. É mau porque em muitas coisas a qualidade não existe, nem o progresso, porque em muitos aspetos eles estão francamente parados no tempo. Ainda assim, pessoalmente acho-os um povo simpático. Nunca se estabelecem relações muito profundas, mas aceitam-nos bem e ajudam se for preciso.

Existem estratégias para se lidar com os inconvenientes. A primeira coisa é tentarmos manter-nos ocupados e descobrir a Irlanda em todos os seus aspetos mais positivos. Seja viajar, descobrir novas atividades ou procurar conhecer outras pessoas. Em Portugal, desde sempre crescemos habituados a ficar em casa quando o tempo está mau. Aqui essa filosofia faz sorrir… Temos de nos abstrair e ser muito persistentes no início, para nos habituarmos a sair na mesma. Quanto a comida, sempre podemos optar por produtos biológicos e há já também algumas pessoas que vendem bastantes produtos portugueses. Outra alternativa são as lojas dos indianos e chineses, que tem algumas coisas importadas que são boas e mais baratas. Haverá sempre alguns produtos que são dificeis de encontrar, sobretudo peixe fresco bom e variado.

3. Qual o conselho que dás aos seguidores do ICote?

Ficam aqui as respostas a algumas questões frequentes:

– Atualmente não é facil arranjar emprego na Irlanda, excepto nas áreas de informática e áreas ligidas à saúde (médicos, enfermeiros, etc). Talvez hajam outras áreas que não conheco bem que também sejam boas, mas acho que estas duas são as melhores. A dificuldade existe mesmo também a nivel de empregos não qualificados (limpezas, etc), porque muitas pessoas procuram esses empregos, sobretudo quando não falam inglês. Vivo na Irlanda há mais de cinco anos e atualmente trabalho em informática. As portas que se abrem não tem fim, vale mesmo a pena.

– É quase impossivel arranjar emprego sem viver aqui. É preciso juntar dinheiro, mudarem-se para cá e procurarem emprego depois, a não ser que a vossa experiencia e qualificações sejam muito únicas e procuradas, o que é raro.

– Proporcionalmente, pagam-se menos impostos na Irlanda do que em Portugal.

– É necessário paciência e versatilidade para arranjar casa. É difícil quando não se tem emprego, porque os senhorios tem receio de que não tenhamos dinheiro para pagar. Com alguma paciencia, encontra-se um quarto para alugar, mas para chegar ao um nível de conforto que estamos habituados é preciso pagar bastante. Para se poupar, no início, vive-se em casas velhas e num estado de conservação que deixa a desejar, por vezes a partilhar com várias pessoas.

Em suma, diria que vale a pena vir para a Irlanda caso a vossa situação em Portugal seja má a nível profissional, e sobretudo se a vossa experiência for numa das áreas mais procuradas. Haverá certamente sacrifícios a fazer, mas o que custa é o início. Depois, adaptamo-nos. E sobretudo é bom não andar aflito a contar tostões ao fim do mês, e até conseguir poupar! Podemos também ver a Irlanda como “trampolim” para ir depois para outros países, sobretudo quem é da área informática, porque os projetos são mais alargados e há muitas multinacionais com escritórios em todo o mundo. Conheço quem tenha ficado cá alguns anos e depois tenha ido para os Estados Unidos ou a Austrália, etc. É preciso é coragem, persistência e um pouco de sorte.

10/04/2013